A partir de três textos de autores diferentes,com destaque para Almeida Negreiros, Fernando Moreira constroi um espectáculo dorido, pessimista, carregado de símbolos, signos, sinais em que o elemento matricial é a água. O espaço cénico constroi-se e desenvolve-se partir de um lago - ele é o elemento catalizador. Ao longo de 70 minutos percebemos como a água purifica, lava,abençoa, rega, transforma. O texto na boca dos actores Valdemar Santos e Ângela Marques assenta neste pressuposto: num mundo caótico, antropofágico e vazio de valores pouco podemos fazer. Pior que o deficit económico é o deficit espiritual e emocional. Isto não passaria de um discurso negativista (e simplificado) à Shopenhauer se Fernando Moreira não tem criado uma fabulosa personagem: o menino adulto, interpretado pelo Pedro Carvalho, um matulão (fisicamente, claro). É por ele que passam os melhores registos cénicos. É com ele que nos comovemos. É com ele que nos solidarizamos. É dele que nos impregnamos num certo desejo de regressar à ignorância e bondade infantil. Plasticamente muito belo o espectáculo não deixa de incomodar: é o bello horribilis.
O esforço físico e espírito de sacrifício exigido aos actores é tremendo. Atirado para um patamar superior de qualidade estética, são realizações deste cariz que me fazem gostar cada vez desta grande e superior ARTE DO FINGIMENTO. Como é pobre o cinema, ao pretender imitar a realidade.
Uma nota final para a selecção musical feita por Carlos Adolfo. Ao longo da peça vamos ouvindo uma música primordial e telúrica, como se fosse a Terra a respirar.
sábado, 12 de junho de 2010
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