domingo, 6 de dezembro de 2009

Fui ver debaixo da ponte do Freixo A HISTÓRIA DE UMA ESTÓRIA

O que eu sabia, muito, muito vagamente  da poeta Stevie Smith, é que ela se cruzara com um outro poeta, o Ted Hughes, casado que foi com a grandíssima poeta Sylvia Plath, que se suicidou aos 31 anos, e como diria Santa Teresa de Ávila, "morro por não morrer". Isto está tudo contado num belo filme intitulado "Sylvia", interpretado pela Gwyneth Paltrow, que enfim, um filme deste calibre  merecia uma actiz carismática, capaz de uma profunda carga dramática, que não é bem o caso da seráfica Gwyneth. De qualquer modo, o filme "Sylvia" deve fazer parte da filmoteca de qualquer cinéfilo.
Daí ter ido ao CACE também com este item de curiosidade acrescido: o que levara José Geraldo a escrever um texto dramático inspirado num conto de uma escritora,essencialmente poeta?
Num espaço plasmável como uma plasticina, camaleónico, vi no CACE o que nunca tinha visto: uma espécie de palco à italiana, querendo o encenador com esta solução, marcar um certo distanciamento em relação aos espectadores. Distaciamento físico e distanciamento emocional.
E de outra maneira, na prática, nem podia ser, considerando que todo o espectáculo se desenrola tendo uma polifacetada máquina de cena como geradora e centralizadora de toda a acção.
É esta máquina de cena que acaba por dominar toda a acção cénica, numa arquitectura de soluções muito criativas, trazendo para o teatro aquilo que para mim, e não me canso de dizer, está no seu ADN: ele é a grande e superior arte do fingimento.
E é aquela máquina de cena que mais do que permitir contar a Hstória de Uma Estória, faz com que em cena haja teatro dentro do teatro,pois a própria máquina, labiríntica, tentacular e poli-semântica, é teatro.
E o que vi naqueles 55 minutos de espectáculo foi TODO o teatro. Desde um texto relativamente acessível, passado por uma espécie de café-teatro, um quase teatro de marionetes, até a um coro grego, despido de tragédia negra, travestido de um certeiro espírito de bobo.
O que se passou ali foi uma hora de entretenimento, não um entretenimento infantilizante, mas que nos atrai, enriquece e inquieta. Porque o texto na sua aparente singeleza coloca o dedo nesta questão: em quem devemos acreditar? Ou não devemos acreditar em ninguém?
O espectáculo que me agradou cabalmente situa-se naquele patamar óptimo  que eu defendo: mantendo inexoravelmente a qualidade, ele consegue chamar ao teatro e fazer gostar de teatro aqueles que têm as suas cabeças  formatadas pelas telenovelas e pelo cinema Luso-Mundo e Castello-Lopes.
O papel assumido pelo "coro grego"(!) ao ter uma intervenção transversal em toda a peça, e pela maneira como o encenador o recriou, acabou por dar-lhe um protagonismo, essencial para tornar o espéctaculo no seu todo num agradabilíssimo trabalho, assumindo um papel que vai muito para além daquilo que fazia Brecht.
Boa presença em palco das actrizes, com uma dicção perfeita. Linda Rodrigues é Helena, a escritora,num desempenho contido, diria até refreado, e que em meu entender acaba por ser "prejudicado" pelo excelente histrionismo da Ana Margarida Carvalho. De facto, o burlesco bem sucedio por esta actriz, acaba por abafar o próprio texto que ela debita, de tal modo que a partir de certo momento o público já se ria,só de a ver entrar.
Não esquecendo que a pessoa que escreve este blog não passa de uma amador de teatro, entendo que ao monólogo final de Helena, onde ela se interroga e interroga o mundo à sua volta - monólogo fundamental para se entender toda a peça - deveria ter sido dado um outro relevo cénico e uma outra marcação. Tive por vezes a sensação, embora reconheça que possa estar errado, que a actriz se encontrava ali um pouco perdida.
Entendo ainda que os dois papéis atribudos a Rui Queirós de Matos eram desnecessários. A intriga seria muito mais interessante se, ao manter o triângulo tradicional do conflito, Helena-Bela-(o sempre ausente) Rolando, os espaços de ligação e de complemento da acção estivessem a cargo dos excelentes "Les Saint Armand".
Houve momentos na peça  em que me recordei dos celebérrimos "Jograis de S.Paulo" uns debitadores colectivos de poesia dos anos setenta.
Entendo por fim que "A Historia de Uma Estória" estando ele naquele patamar óptimo deveria ser divulgado pelas escolas e aí, sim,conquistar público.
 

1 comentário:

  1. A peça "Debaixo da Ponte", publicada na Revista de Teatro da SBAT 513, 2002, RJ, do dramaturgo alagoano Marcello Ricardo Almeida. É uma peça de teatro com dois personagens: Sobaco e Chulé. Além de apresentada a peça em vários Estados, agora, atravessou o Atlântico e está sendo apresentada em países europeus.

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